quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Educação física Não é Esporte ?

Educação física Não é Esporte ?

"O culto único do corpo, como hoje se apregoa, não satisfaz porque é bruto, insensível, não troca, não usufrui, não sente.

É incapaz de diferenciarmentalmente as nuances da vida, impotente diante da sensibilidade e percepção espiritual - bonecos, corpos esculturais, pedras híbridas de vida.

A conjunção corpo - espírito - emoção é impossível sem passarmos pela ponte mente - a grande porta para o território das sensações"


Nuno Cobra

Para Helal (1990), esporte é qualquer competição que inclua uma medida importante de habilidade física e que esteja subordinada a uma organização mais ampla que escape ao controle daqueles que participam ativamente da ação.
Os pressupostos básicos que caracterizam o esporte estão ligados a idéia de competição, performance, motivação extrínseca e inflexibilidade das regras. Estes pressupostos aliados às influências externas da política, da psicologia, do marketing, da administração, da sociologia, caracterizam o esporte como atividade peculiar (VERENGUER, 1989).

A prática esportiva está presente desde os primórdios da humanidade, onde o seu verdadeiro sentido se transforma com a realidade atual, esta mutação pode ocorrer, por exemplo, desde a busca por uma condição física até para a atividade competitiva em si.



O esporte é na atualidade um dos principais fenômenos sociais e uma das maiores instituições do planeta. Ele tem refletido a forma como a sociedade vem se organizando, espelhando as diferenças entre Estados, povos e classes sociais, além de se tornar um dos principais elementos da indústria cultural contemporânea, matéria prima dos meios de comunicação de massa e uma das poucas formas, reconhecidamente, honestas de rápida ascensão social (RÚBIO 2002).






Esporte e educação

As crianças são mantidas imóveis enquanto "aprendem" porque ainda persiste o ranço de que o corpo que se movimenta não tem nada a ver com a mente que raciocina... a desordem é ignorada no espaço da ordem. Uma não convive jamais com a outra.


Freire (1991) As pessoas são "educadas" como se fossem um espírito ou uma mente.


O corpo fica do lado de fora das instituições.

A caricatura das escolas é um corpo minúsculo com uma imensa cabeça.

Quando na escola a Educação Física se volta única e exclusivamente para a prática esportiva existe uma exclusão daqueles que mais necessitariam desenvolver-se. O profissional da área se marginaliza pelo fato de só saber trabalhar com o corpo, desprezando outros aspectos do ser humano, como o cognitivo, afetivo, social e psicológico.
Na concepção dos professores de Educação Física em determinadas ocasiões, o esporte é considerado como um conteúdo mínimo e único, o que acaba se tornando a exclusiva prioridade a ser promovida entre seus alunos: aos que jogam bem, a oportunidade de praticar; aos que possuem dificuldades, acabam como juiz, gandula ou ainda sentados no banco, só observando a turma jogar.

Nestes casos, não há saúde social, ou, sequer, saúde motora.

Como deve se sentir o aluno que permanece sentado durante toda a atividade dos colegas? O que ele acaba por representar? E sobre a prática de distribuir os alunos em dois times, onde são escolhidos um por vez, alternadamente: como se sente o último a ser escolhido? Como "resto"? São estas as práticas a serem repensadas (BARRETO, 2003).
Em desacordo com a percepção de estética, os PCN's opõem atividades competitivas a recreativas - como se tal divisão fosse humanamente possível - afirmando que nas primeiras se valoriza a eficiência e nas segundas atividades a plasticidade estética.

A harmonia corporal conseguida para se atingir a perfeição atlética resulta num conjunto de movimentos esteticamente conseguidos, isto já para não falar das modalidades de muita estética, tais como as diversas ginásticas, principalmente a rítmica e a aeróbica, que acabam sendo colocadas como de manutenção da saúde e não em um outro item de atividades rítmicas ou expressivas ou mesmo inseridas nas atividades de competição.

Existe a necessidade de dissociar a Educação Física escolar de treinamento esportivo.

A inserção dos alunos obesos, lentos e sem muita coordenação motora trará mais qualidade de vida ao conjunto, ensinando, não apenas, nossos limites, mas também em como conviver com os limites alheios.
Nas escolas, os pré-requisitos para os professores de Educação Física não devem ser grandes atletas que sabem jogar, devem ser grandes professores que saibam ensinar.

Do contrário, o Esporte deixa de ser um agente de inclusão social para ser um fator de exclusão social, onde "quem joga bem, joga; quem não joga bem, que fique quieto e não atrapalhe" (BARRETO, 2003).

Não tem como negar que o esporte é um facilitador para desenvolver atitudes de respeito, disciplina, companheirismo, a relação intra e interpessoal e assimilação de vários conceitos. Contudo se a sua prática visa apenas o rendimento e grandes performances em competições de alto nível, fazendo com que as aulas de Educação Física escolar se transformem em treinos que propõem apenas o rendimento padronizado e permite que só uma minoria tenha sucesso sobre a grande maioria rotulando - os desde cedo de fracassados, o esporte, dentro da escola, pecará no cumprimento de seus reais objetivos.

Para uma educação satisfatória e de sucesso dentro da Educação Física é importante referir que a prática desportiva constitui um fator principal na construção da cidadania, já que especificamente compõe um dos raros espaços de que o educando dispõe para vivenciar a ludicidade.


Soma-se a este aspecto o valor do esporte em poder incentivar a procura por hábitos saudáveis desde cedo, prevenindo males e procurando combater o sedentarismo.

Esporte e saúde, esporte e estilo de vida ativo, esporte e participação, esporte e inclusão social, esporte e cidadania, esporte e qualidade de vida: eis as questões que devem nortear a prática educativa através do esporte educacional.


O poder de crítica do educador, certamente, será fundamental para fazer da escola o espaço político onde o destaque não seja apenas pela produção de riquezas, mas também como uma forma de permitir ao educando vivenciar a sua própria humanidade
Esporte e saúde
Cada vez mais está sendo possível presenciar com freqüência termos como "stress" e "qualidade de vida" devido ao momento atual do país e a carga árida com a qual as pessoas estão sendo sobrecarregadas, e sobre estes termos é que os objetivos e os fins da ação educacional da Educação Física devem operacionalizar sua prática através do esporte orientado principalmente para o bem estar.
Para Ribeiro (2001) saúde é alegria de viver.

É estar encantado com a vida.

É ter entusiasmo, alegria, vitalidade, disposição.

Saúde é um processo de equilíbrio do organismo.
São milhões de mecanismos interagindo e movimentando o interior do seu corpo para que tudo funcione adequadamente.
A pessoa encantada pela vida tem o cérebro trabalhando na formação de hormônios de altíssima qualidade que vão nutrir a perfeita elaboração da química interna nos bilhões de reações que ocorrem no organismo todo o tempo.
Muitas vezes os esportes são praticados de forma incorreta, podendo representar desafios inatingíveis, níveis de exigência incompatíveis com realidade atual, que acabam levando a situações de risco para a saúde ou mesmo na melhor das hipóteses a desistência de um projeto que se mostrava promissor.
A prática esportiva, ainda que em excesso, não mata ninguém isoladamente. Mas também não se pode negar que essa prática desmedida, muitas vezes cobrada dos atletas atualmente, tem papel decisivo na evolução de determinados quadros patológicos, tornando o atleta mais vulnerável a determinadas complicações.



Sendo assim, a situação só chegará a condições críticas se houver uma doença pré-existente - o esporte não cria cardiopatias (MARQUES, 2004).

Esporte e democracia
Para uma Educação Física e o Esporte realmente preocupados com o ser humano não basta concordar plenamente com a sociedade.

É necessário que se faça uma permanente crítica social; seja sensível às diversas formas de repressão a que as pessoas estão sujeitas e as ajudem a entender os seus determinismos e superar os seus condicionamentos, tornando -as cada vez mais livres e humanas (MEDINA, 1989).
Existe a predominância da racionalização e o fenômeno da descorporalização, e a exploração do corpo do trabalhador no sistema capitalista, corpo separado do espírito, dominado pelas elites e devidamente controlado pelo Estado, que agiu nos corpos dos indivíduos, oprimindo-os e dominando-os.

A abstração inerente ao modo de produção capitalista trouxe, assim, a ruptura das relações imediatas do ser humano com seu corpo e com a natureza, gerando a valorização do intelectual em detrimento do trabalho corporal e manual, destinado sempre às classes dominadas. (GONÇALVES, 1994).
Está cada vez mais claro que no sistema capitalista o real é o limite e os atos esportivos vão contra a relação entre os meios e os fins.

Neste modelo de sociedade, o esporte passou a ser regido pelo desempenho, pela lógica da vitória a qualquer preço, por uma postura mercantilista.

O esporte seria uma mercadoria como qualquer outra e os esportistas, produtos a serem consumidos por um mercado cobiçado de bons negócios.

Deste modo, é com esta grande competição presente na sociedade que surgiram novas necessidades que devem merecer dos educadores reflexão e ação.
Esporte e cidadania
O corpo, que antes era incentivado a se moldar de acordo com as necessidades das fábricas e dos meios de produção, agora passa a ser influenciado a se enquadrar nos ideais de uma nova indústria, chamada Indústria Cultural, por ser capaz de modificar, produzir, ou orientar a criação de novas tendências de comportamento dentro da sociedade.


Em busca por se adequar a essa nova necessidade de "corpo perfeito" vem criar um novo indivíduo que deixa de ter uma identidade própria, passando a expressar a identidade que as várias etiquetas lhe concedem (SCHNEIDER, 1999).
Dentro da relação corpo - sociedade existe um peso que influencia fortemente a estrutura sócio - econômica e que esta que define, de cera forma, os limites e modelos da estrutura corpórea do brasileiro.

Desde a gestação o ser humano é modelado pelos vários vigentes, pela cultura, pela situação da classe social a qual pertence, e assim, dentro destas circunstâncias, nasce, cresce, vive, sobrevive, adoece e morre.
O mundo atual está ancorado em um modelo de existência em que o tempo e o fruto da ação humana constituem a matriz da convivência em sociedade. Nestes dois pólos, o homem, sujeito de sua própria história, tem experimentado palpáveis estilos de vida jamais imaginados e que não raro resultam por contrariar tudo aquilo que foi produzido como conhecimento e, desse modo, as verdades dos séculos XVIII, XIX e XX foram abaladas em função da busca de um ser perfeito no que se diz respeito ao físico.

Contudo, a Educação Física assim como a prática esportiva, apresenta evidências de que poderá participar do processo de crescimento e desenvolvimento humano, desde que se estruture a partir da caracterização da concepção de corpo que assume, da conceitualização e especificação de suas atividades próprias e de criar condições para humanizar, democratizar e organizar princípios que garantam a práxis pedagógica, tendo em vista superar a concepção de homem, de mulher, visto como um corpo máquina, que não pensa, não vive intensamente, limitado apenas a reproduzir o movimento que lhe é determinado (SILVA, 1995).
Conclusão
Cada dia mais estamos considerando o corpo humano como uma verdadeira construção cultural, sendo comparável a um pedaço de madeira que cada um esculpe de acordo com a sua própria vontade e satisfazendo os mais variados projetos individuais.
O desporto, na sua função de microcosmos da sociedade, há muito que se multiplicou em sentidos, permitindo que outras atitudes perante si também se pluralizassem sem, contudo, renunciar à sua essência.

Há muito que o desporto convocou para o seu seio a estética, a construção corporal idealizada na beleza das formas, a auscultação de novas sensações corporais, como o risco, o prazer, a experiência da subjetividade e, obviamente, a beleza.
O homem tem a consciência que é um ser finito e essa consciência cada vez mais é nos proporcionado pelo corpo.


Com efeito, o tempo somatiza-se, modificando de tal forma os nossos corpos que basta a imagem destes para que consigamos perceber a idade do outro.

Na busca da eternidade, o homem moderno tudo faz para que o corpo não evidencie as inapagáveis marcas do tempo, tentando assim iludir aquilo que é inflexível e, até hoje, invencível. Cresce o número daquelas pessoas que não querem ser vistas com determinado rótulo exterior, reflexo do tempo, mas com um outro, mesmo que o interior seja completamente diferente. Querem ser vistas sem o tempo, cristalizados num momento efêmero mas socialmente confortável, ou seja, querem permanecer jovens.


O corpo associado a estas idades é aquele onde tudo parece ser harmonia, onde a beleza se irradia com mais evidência, onde se atinge melhor a ilusão da idéia de perfeição humana.

É ainda o corpo com que muitos de nós gostaríamos de perpetuar para a eternidade.





Para que tal aconteça é necessário construir uma imagem esteticamente agradável, valendo tudo, mesmo o desporto, assumindo este um importante papel para a consecução deste processo de simulação (GARCIA, 1999).





Referências bibliográficas
BARRETO, Selva Maria Guimarães. Esporte e Saúde. Revista Eletrônica de Ciências - Número 22 - Outubro / Novembro / Dezembro de 2003.
FREIRE João Batista. De corpo e alma: o discurso da motricidade. São Paulo: Summus, 1991.
GARCIA, R. Da desportivização à somatização da sociedade. In: BENTO, J.; GARCIA, R.; GRAÇA, A. Contextos da pedagogia do desporto. Lisboa: Livros Horizonte, 1999. p. 113-63.
GONÇALVES, Maria Augusta Salin. Corporeidade e educação. Campinas: Papirus, 1994.
HELAL, Ronaldo George. O que é sociologia do esporte?. São Paulo: Brasiliense, 1990.
MARQUES, Renato. Esporte é Saúde? Universia.com.br
MEDINA, João Paulo Subirá. A Educação Física cuida do corpo... e "mente": bases para a renovação e transformação da Educação Física. Campinas: Papirus, 1989.
RIBEIRO, Nuno Cobra. A semente da vitória. São Paulo: SENAC, 2001.
RUBIO, Kátia. Do olímpo ao pós - olimpismo: elementos para uma reflexão sobre o esporte atual. Revista Paulista de Educação Física, São Paulo, v.16, nº.2, 2002.
SCHNEIDER, Omar. O corpo: uma abordagem histórica. Grupo PET- Educação Física. Sobre Educação Física. Vitória: UFES/CEFD, 1999.
SILVA, João Bosco da. Educação Física, esporte, lazer: aprender a aprender fazendo. Londrina: Lido, 1995.
VERENGUER, Rita de Cássia Garcia. Educação Física, Esporte, Dança, Lazer: fenômenos
distintos. 1989. Monografia (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro.